Humilhação pelos olhos de quem a sente e de quem a pratica.
Ontem fui fazer 2 sessões de Meditação para Crianças inseridas num atelier de Férias de Verão.Fui com algum nervosismo porque os grupos eram compostos por crianças de várias idades, e alguns mais velhos do que estou habituada.
Decidi que iríamos falar sobre emoções.Segui o meu esquema habitual em 3 passos:
1. Introdução ao tema: Li a história “ o Pássaro da Alma”
2. Momento meditativo: Fizemos alguns exercícios respiratórios e guiei uma meditação tendo por base a história anterior
3. Representação da aprendizagem: construíram um Pássaro da Alma individual, onde indicaram emoções que tivessem descoberto que sentiam.
A construção do Pássaro deu azo a uma conversa profunda e transformadora. Um dos miúdos mais velhos identificou que se sentia humilhado em algumas situações e o seguinte diálogo aconteceu:
Juliana: Em que situações te sentes humilhado?
Aluno 1: Quando na escola gozam comigo porque sou baixinho. E há professores e auxiliares que também nos humilham.
Aluna 2 e 3: Eu também já me senti humilhada!
Juliana: …..
Juliana: E há mais alguma coisa que sintas nessas situações Aluno1?
Aluno 1: Sim, sinto muita vergonha porque não consigo mudar o facto de ser baixo.
Aluno 2: A mim humilham-me porque sou Gorda.
Aluno 3: A mim também, como sou obeso, chamam-me baleia, elefante, gordo…
Juliana:E como te sentes?
Aluno 3: Nem sei bem, acho que me dói.
Aluna 2: Eu sinto uma raiva enorme e dentro de mim só penso que lhes vou bater e dar um estalo tão grande que nunca mais se metem comigo.
Juliana: E o que é que fazem?
Aluno 2: Eu quando não aguento mais, digo à minha mãe e ela vai à escola. Durante uns tempo passa.
Juliana: Algum de vocês já sentiu que humilhou alguém:
Aluno 4 e 5: Eu! (a rir)
Juliana: e como é que te sentiste?
Aluno 4: Ehh pahhh, o “gajo” estava mesmo a pedi-las.
Aluno 5: Normal.
Juliana: Vocês sabiam que quando gozam e humilham alguém eles provavelmente se sentem como os vossos colegas?
Aluno 4 e 5: …….
Aluno 2: Mas temos uma professora que já chamou analfabeto ao melhor aluno da turma e que todos os dias diz que somos parvos, estúpidos e assim.
Juliana: …..
Aluno 3: Sim, ela é assim, mas ninguém faz nada. Estou a rezar que este ano não seja nossa professora.
No final cada um partilhou o que aprendeu nesta sessão.
A maioria respondeu que aprendeu a respeitar mais os outros porque já percebiam melhor o que poderiam sentir.
Há tantas coisas que me passam pela cabeça depois desta conversa que nem sei por onde começar.
- Foi incrível ver e ouvir a forma aberta como todos falaram do que sentem, sem julgamentos ou gozos.
- Senti que foi super importante para aqueles que assumiram que já humilharam outros colegas, ouvir em 1ª mão o que sentem os outros. Acho que nunca tinham ouvido e nomeado essas emoções desagradáveis.
- Todos ficaram mais elucidados sobre emoções, como as identificar e ficaram pelo menos com mais um forma de lidar com elas: Respiração Consciente e Meditação.
- Compreendemos que muitas emoções andam juntas e por isso se torna mais desafiante lidar com elas.
- Há adultos que precisam de ajuda e não deveriam poder estar junto a pessoas que se estão a desenvolver. A professora que vários referiram precisa de ajuda, não poderá ser referência neste momento. Que haja um sistema que a apoie neste momento (com os dados de burnout que sabemos existir entre os professores, é cada vez mais importante estes apoios estarem disponíveis).
Cada vez sinto mais que proporcionarmos momentos destes nas escolas é essencial (quer seja formal ou informalmente). Seres equilibrados são seres que se conhecem e consequentemente conseguem sentir empatia e respeito pelo outro.
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Autor: Juliana Barroso